A correlação entre tentativas de homicídio seguidas de suicídio tem sido pesquisada nas últimas décadas e está relacionada ao Bullying – fenômeno que exibe atitudes covardes, intencionais e repetidas, manifestadas numa relação desigual de poder, a fim de tirar a paz de suas vítimas predestinadas.
E, quando não causa sequela física, provoca consequências psicológicas ou emocionais graves nas vítimas, pois as atitudes agressivas não têm um motivo justo, e são adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s), causando dor, angústia, esgotamento e insegurança, decorrentes dessas experiências negativas.
Por ser um fenômeno social, o Bullying é manifestado de maneira sutil e tem características próprias, pois trata-se de um tipo de violência escolar e, segundo a literatura, há registros de ocorrências de pessoas que sofriam Bullying que, em atos de extremismo, para findar seu sofrimento, cometeram homicídio seguido de suicídio, pela incapacidade de agir contra a pressão imposta pelos agressores/intimidadores de Bullying.
E, segundo relatos, essas vítimas não tinham intenção de atingir especificamente um ou outro estudante, porque o objetivo era “matar a escola”, ou seja, o espaço geográfico onde passaram momentos de frustração, vergonha, medo, humilhação, perante professores e colegas omissos.
Infelizmente, a mesma sociedade que lamenta o que aconteceu em Suzano (2019), e em Goiânia (2017), é a mesma que ignora ou negligencia os sinais, porque as vítimas dão sinais, como por exemplo, o aluno quieto em sala de aula ou o filho que fica trancado no quarto, o que usa moletom em dias insuportavelmente quentes, o que cobre a cabeça com capuz, o isolado no intervalo, o que passa a noite na internet, o de “olhar” vazio, etc.
As vítimas de Bullying mostram-se inábeis para solicitar ajuda ou reagir frente à situação de conflito, porque são pessoas pouco sociáveis, inseguras, desesperançadas, com baixa auto-estima, quietas, passivas e com forte sentimento de insegurança e, isso as afeta no rendimento escolar e na frequência às aulas, pois acabam se recusando a ir à escola, visto que os agressores/intimidadores, na maioria dos casos, são da mesma sala de aula.
Nesse contexto, a questão a ser esclarecida é muito mais complexa do que brincadeiras diárias entre crianças ou adolescentes, no ambiente escolar, pois, a problemática enfrentada por alunos, pais e professores emerge quando, involuntariamente, a vítima toma para si as agressões impostas pelo Bullying, permitindo-se sofrer em um ponto muito específico do ser humano, chamado alma.
A dor na alma de uma vítima de Bullying é devastadora, podendo ser percebida pelo declínio do seu rendimento escolar, isolamento e ausência às aulas e, assim, arrisco-me a descrever que para prevenir o Bullying há a necessidade de que pais, alunos e professores estejam dispostos a interpretar o silêncio de possíveis vítimas, pois, sem o apoio de que elas precisam, jamais irão suportar as situações impostas pelo fenômeno, por inúmeros fatores e, dentre eles, a vulnerabilidade frente aos ataques contra suas almas. Em decorrência disso, toda a comunidade escolar sofrerá por consequência.
Ao mesmo tempo em que a vítima não encontra ajuda necessária, capaz de lhe dar suporte, o agressor/intimidador também dificilmente encontra quem o faça cessar e/ou o conscientize e o sensibilize para a boa convivência em sociedade.
Em relação especificamente ao caso de Bullying, tanto para agressores, quanto para vítimas e espectadores existe a carência de habilidades relacionais pelo fato de não as desenvolveram individualmente e porque lhes faltou oportunidade de se sentirem inseridos em contextos caracterizados pedagogicamente, nos quais poderiam aprendê-las e exercitá-las.
Porém, o problema não é apenas familiar, pois nem sempre o contexto-escola e o grupo-classe têm sido para agressores/intimidadores e vítimas, educativos, significativos ou úteis, porque o sistema educativo que os cerca não foi suficientemente incisivo para evitar que caíssem nesses dois estereótipos.
Assim, um contexto significativo, para a vítima, é aquele que, antes de mais nada, consegue protegê-la das intimidações e humilhações; e que, depois, permite que desenvolva com menos tensões sua capacidade de autodefesa. Para o agressor, por sua vez, é um contexto que, de um lado, o paralisa e o revela em sua ação transgressiva e, de outro, o induz a aprender as regras básicas da vida em comum (respeito ao outro, controle dos impulsos etc.), da sociabilidade e da solidariedade.
Ressalto, ainda, que embora aconteça em todos os níveis de ensino, a presença do Bullying é notada com certa frequência no Ensino Médio, fase que coincide com a adolescência, onde o indivíduo se encontra em transição física, emocional e psicológica entre a infância e a fase adulta.
Esta última característica justificou a minha pesquisa com alunos de primeira série de Ensino Médio, de três escolas distintas, de clientela oriunda de bairros variados, alcançando assim uma representatividade do município de Araraquara – SP, estudo esse que resultou na primeira Dissertação de Mestrado publicada, no Brasil, sobre o tema.
Acredito que a solução, ou pelo menos a busca de solução, está na união de esforços entre poder público e sociedade, assumindo a existência de fenômeno em todos os lugares frequentáveis e, assim, ter a possibilidade de agir em favor dos atores sociais para que haja uma mudança real de comportamento e por consequência, a minimização, a prevenção e o combate eficaz ao Bullying.
Por fim, é urgente que tal temática seja abordada em sala de aula, pois segundo a minha pesquisa, três em cada dez alunos, percebem a presença do Bullying no espaço escolar e, conscientizá-los é o papel da escola, pois acredito que o espaço escolar deve oferecer meios de conscientização sobre o respeito e as regras de conduta frente ao coletivo, neutralizando possíveis ações transgressivas e, ao mesmo tempo, cumprindo o que está previsto na Lei 13.185 – Programa de Combate à Violência Sistemática, vigente em todo o território nacional.
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